Sucessão dos Ascendentes em Concorrência com o Cônjuge

Em outro anterior, falamos um pouco como se dava a sucessão civil dos ascendentes. Porém, focamos nos casos em que o falecido só havia deixado pais ou avós vivos. Isto é, apresentamos exemplos de como se daria a divisão dos bens nos casos em que somente os ascendentes herdavam a herança.


No artigo de hoje, trataremos um pouco de como é a sucessão dos ascendentes quando eles concorrem com o cônjuge sobrevivente. Ou seja, como é a divisão dos bens quando o falecido deixou ascendentes e cônjuge/companheiro(a) sobrevivente.


No mais, interessante se faz dizer que os ascedentes são chamados a suceder na falta de descendentes. Essa "falta" de descendentes engloba a inexistência deles, a perda da condição de herdeiro por causa de uma deserdação ou indginidade, ou, ainda, a renúncia de "todos" os descendentes à herança.


Quando se fala em renúncia de todos os descendentes, está a se dizer a renúncia de "todos". Por exemplo, falecendo alguém que deixe um cônjuge sobrevivente, bem como, deixando filhos desse relacionamento, caso os filhos tenham a intenção de deixar a herança com a viúva mediante uma renúncia de direitos hereditários, eles não poderão ter descendentes.


Em caso de existência de descendentes (netos do falecido), esse patrimônio renunciado por todos os seus filhos não irá para a falecida mãe, mas, isso sim, para os netos.


É dizer, os netos, também não podendo ter descendentes, teriam que renunciar para que, com isso, o bem pudesse ficar com a viúva. Eis o motivo de dizer que todos os descendentes teriam que renunciar.


Trata-se das especificações dos artigos 1.810 e 1.811 do Código Civil/2002.

1) Fundamentação legal da sucessão dos ascendentes em concorrência com o cônjuge

A sucessão hereditária dos ascendentes em concorrência com o cônjuge está prevista no art. 1.829, inciso II, do Código Civil brasileiro. Vejamos como está descrita a referida norma:


Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: [...]

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; [...]


Mais a frente, para ser preciso, no art. 1.836, o Código Civil/2002 é firme ao transcrever o seguinte mandamento: "Na falta de descendentes, são chamados à sucessão os ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente".


Desta forma, percebe-se que, inexistindo descendente no momento do falecimento de um indivíduo, os seus bens serão divididos entre os seus ascendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente.


Neste ponto, torna-se fundamental fazer o destaque de que a legislação civil trata de descendente, e não de filhos. É dizer, caso o falecido não tenha filho vivo, no entanto, venha a falecer possuindo netos, esses é que serão chamados a suceder, e não os ascendentes do falecido. O mesmo vale para os bisnetos, trinetos e toda a linha descendente.


Assim, caso o falecido não tenha descendentes (filhos, netos, bisnetos e etc), as pessoas que serão chamadas a suceder serão as previstas no inciso II, do art. 1.829, do Código Civil/2002.


Aqui, destaca-se o fato de o Código Civil relatar ascendentes. Ou seja, não está restrito somente aos pais, que são ascendentes em primeiro grau. Ascendentes, engloba, também, os avós, bisavós, trisavós e assim sucessivamente.

2) Eu vivia em união estável. Tenho direito a herança em concorrência com o ascendente?

Quando o Código Civil trata de cônjuge sobrevivente, deve-se entender não somente as pessoas casadas, mas, também, os companheiros. Isto é, as pessoas que viviam em união estável também podem receber a herança deixada em razão do falecimento de seu convivente.


Atualmente, entende-se que tanto as pessoas casadas quanto as pessoas que vivem em união estável possuem os mesmos direitos sucessórios. E esse entendimento adveio de decisão do Supremo Tribunal Federal - STF.


Para ser preciso, a decisão de equiparação dos efeitos sucessórios do cônjuge e do convivente em união estável foi proferido em dois processos, quais sejam: RE 646721 e RE 878694.


Em outras palavras, não importa se a pessoa era casada ou vivia em união estável, o entendimento atual é o de que a sucessão do falecido beneficiará o sobrevivente, seja ele cônjuge ou companheiro(a). Da mesma forma que um cônjuge herda, assim também herdará o convivente. Devido isso, quando falamos nesse artigo sobre cônjuge, leia-se cônjuge/companheiro(a). O contrário também é válido, ou seja, ao falarmos de companheiro(a), inclua-se, também, o cônjuge.


Portanto, a resposta a pergunta presente neste tópico é sim. Ou seja, se a pessoa vivia em união estável, ela possui direito a herança em concorrência com os ascendentes, e isso, inclusive, nas mesmas condições que uma pessoa casada herdaria. O único detalhe é que, para o cônjuge/companheiro(a) herdar em concorrência com os ascendentes, o falecido não pode ter deixado descendente.

3) Como é essa concorrência entre cônjuge/companheiro(a) e o ascendente?

Pois bem. Como visto, na ausência de descendentes, são chamados à sucessão os ascendentes em concorrência com o cônjuge/companheiro(a) sobrevivente. Isso nós já sabemos. Mas, aqui fica uma pergunta, como é que se dá essa concorrência, como fica a divisão do acervo hereditário?

3.1) Concorrência entre os pais do falecido e o cônjuge/companheiro

Neste ponto, é importante ressaltar que os primeiros ascendentes a serem chamados à sucessão são, justamente, os ascendentes de primeiro grau. Ou seja, os genitores do falecido.


Tendo o falecido deixado um cônjuge/companheiro sobrevivente e ainda ambos os genitores (pai e mãe) vivos, a herança tem de ser divida por três. Cabendo, desta forma, um terço da herança ao cônjuge/companheiro; um terço ao genitor do falecido e, por último, um terço à genitora. Esse, inclusive, é o mandamento do art. 1.837 do Código Civil/2002. Vejamos:


Art. 1.837. Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau.


Aqui cabe um destaque, o valor que é dividido por três é o valor da herança, isto é, não entra nesse cálculo a meação do cônjuge sobrevivente, haja vista que meação e herança são patrimônios distintos.

3.1.1) A concorrência entre cônjuge e ascendentes independe do regime de bens do casal

Um detalhe crucial deve ser levantado. A concorrência hereditária entre o cônjuge e os ascendentes independem do regime de bens do casal.


Ou seja, não importa se o falecido era casado no regime de comunhão parcial, no regime de comunhão universal, no regime de separação convencional e etc.


Em todos os casos de regime de bens o cônjuge sobrevivente irá herdar em concorrência com os ascendentes. A importancia do regime de bens é verificada para se encontrar a possível meação do cônjuge/companheiro(a), e não para firmar se a esposa/convivente possui direito de herdar em conjunto com o genitor do falecido.


Assim, o cônjuge sobrevivente herdará quando concorrer com o ascendente, independentemente de o regime de bens do falecido conceder ou não o direito à meação.

3.2) Concorrência entre um genitor e o cônjuge/companheiro(a)

Pode ser que o indivíduo ao falecer tenha deixado somente um dos seus genitores vivos e, em conjunto com ele, um cônjuge/companheiro(a).


Nesses casos em que só há um genitor de primeiro grau vivo, a exemplo do pai ou da mãe, a herança será divida pela metade com o cônjuge/companheiro(a) sobrevivente.


Tal mandamento também pode ser retirado do próprio art. 1.837 do Código Civil/2002, norma que já citamos no bloco anterior e cuja redação que nos interessa está escrita da seguinte forma: caber-lhe-á (cônjuge) a metade desta (herança) se houver um só ascendente.


Como o trecho relata que ao cônjuge caberá metade da herança quando concorre somente com um ascendente, é facilmente constatável que a outra metade caberá ao genitor(a) vivo(a), seja ele o pai ou a mãe do finado.

3.3) Concorrência entre cônjuge/companheiro(a) e o avô, bisavô, trisavô e etc

O art. 1.837 do Código Civil/2002, na sua parte final, ainda relata os casos em que a concorrência do cônjuge/companheiro(a) se dá com ascendente de segundo grau em diante. Ou seja, os ascendentes como avôs (2º grau), bisavôs (3º grau), trisavôs (4º grau) e etc.


A parte final do artigo revela o seguinte: "caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau."


Assim, caso seja um ascendente de segundo grau em diante, metade da herança é o que caberá aos ascendentes existentes. Isto é, caso sejam os avôs, a metade caberá a eles, caso não haja avós, a metade será dada aos bisavós, e assim sucessivamente. E isso ocorre por causa da disposição final do art. 1.837 do CC/2002, como já apontado acima.


Dessa forma, existindo concorrência do companheiro(a) com ascendentes de 2º grau em diante, a metade da herança caberá ao cônjuge/companheiro(a) e a outra metade será dada ao ascendente vivo.


Caso, por exemplo, haja três avós vivos e nenhum genitor, metade da herança deve ser entregue ao cônjuge e a outra metade será dividia entre os três ascendentes de segundo grau (no caso, aos três avós), independentemente da linha a qual pertencem, seja a materna, seja a paterna.

4) Conclusão

Ante o exposto, possível se faz a conclusão de que na ausência de descendentes, o cônjuge/companheiro(a) é chamado a suceder em concorrência com os ascendentes.


Outrossim, quando os genitores do falecido são vivos e há, ainda, cônjuge sobrevivente, a herança é dividida em três partes iguais, cabendo 1/3 (um terço) a cada indivíduo.


Por fim, caso haja somente um ascendente de primeiro grau vivo ou, então, quando o grau de ascendência for superior àquele (2º, 3º, 4º grau e etc), a herança será divida pela metade, cabendo metade ao cônjuge e a outra metade aos ascendentes que porventura estiverem habilitados.

Fontes

Abaixo, apresentamos algumas fontes utilizadas para a elaboração deste artigo.

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Página voltada para o estudo do Direito das Sucessões, com foco em inventário judicial e extrajudicial.